segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Dinheiro: a primeira camada - Pedro Palhoto


http://pedropalhoto.wordpress.com/2013/02/23/dinheiro-a-primeira-camada/

Como se obtém dinheiro? Quem tem dinheiro? Onde se investe dinheiro? Como se gere dinheiro? O que é dinheiro?
Todas estas perguntas são lidadas por diversas fontes com muita frequência, só que há uma que raramente é feita:
Como é que dinheiro é criado?
AgKcy
O funcionamento do dinheiro predominante (os euros, dollars, libras, etc.) são várias camadas de conceitos uns em cima dos outros, o que no final se faz parecer um grande esparguete. Dizem-nos que necessitamos de um curso superior na área financeira para se fazer algum sentido. Nada podia estar mais longe da verdade.
Para podermos descascar todas estas camadas para perceber qual é a primeira, o mais fácil será com um simples exercício, começando do zero. Para isso, vamos imaginar que vivemos numa região do mundo em que ainda não existe dinheiro, há cerca de 4000 anos atrás.
Imaginem que vivem numa aldeia com dez famílias, e cada uma tem uma diferente especialidade de produção. Uns criam gado, outros galinhas, há quem coza pão, e há quem faça e arranje roupa. Para terem o que precisam, trocam produtos e serviços entre vós, vivem numa economia de troca directa. Isto gera alguma confusão e dificuldade de progresso rápido, pois às vezes não têm troco dado o menor que têm são vacas e só precisam de uma galinha, por exemplo. Pior ainda, se não souberem ler e escrever, o que era muito comum na altura, não conseguiriam apontar com precisão quem deve o quê a quem.
Até que um belo dia passa pela vossa aldeia, um ferreiro. O ferreiro olha para o que vocês estão a fazer e diz:
– Tenho aqui uns pequenos pedaços redondos de metal, a que chamo moedas, e podem experimentar gratuitamente durante uma semana. Experimentem usar como intermédio entre as vossas trocas.
Vocês olham uns para os outros e decidem experimentar. O ferreiro dá dez moedas a cada família e segue o seu caminho.
Depois de fixarem preços, vocês passaram a ter muito mais tempo livre, e as questões de trocos ficaram resolvidas, estão todos muito satisfeitos. Ao fim de uma semana, o ferreiro volta para ver o vosso estado. Como vocês sentiram progressos significativos, pedem ao ferreiro que vos deixe ficar com as moedas. O ferreiro concorda, numa condição. Ao fim de um ano, cada família terá de ter 11 moedas, caso contrário irão ter de entregar-lhe posses que tenham.
Como as moedas se tornaram tão úteis para vós, vão em frente com a proposta. O tempo passa e tudo está óptimo, melhor até do que antes de terem as moedas, a aldeia cresce a olhos vistos. Quando está quase a fazer um ano, lembram-se que o ferreiro está quase para aparecer. Aí pedem mais moedas que o habitual pelos vossos produtos e serviços, e quando se apercebem, todos os restantes vizinhos fizeram exactamente o mesmo. De repente existem muito menos moedas em circulação na vossa aldeia e o comércio estagna.
Quando o ferreiro chega, repara que nem todos têm as 11 moedas. Quem tinha 9 moedas teve de dar três galinhas, o que teve 7 moedas teve que abdicar do burro e o que teve 4 moedas teve que abdicar da casa. Mas não se preocupem, porque essa pessoa agora paga uma renda ao ferreiro pela casa, e no próximo ano tem que ter treze moedas. Com o início de uma próxima ronda, mais dinheiro é posto em circulação, com novos juros ao fim de mais um ano.
Começa a soar familiar? Está na altura de fazer um ponto de situação.
Quantas moedas ao todo existiam na aldeia no início? 10 famílias, com 10 moedas cada, significa que são 100 moedas ao todo.
E quantas seriam necessárias para que ninguém ficasse a perder? 110 moedas.
Como é que as 10 moedas adicionais podiam ser obtidas ao longo do ano para que todos pudessem ganhar? Sem ser através do ferreiro, é impossível.
Isto significa que este jogo do dinheiro criado por uma entidade externa nunca pode ser ganho por todos, alguém tem sempre de perder. O ferreiro, ou em linguagem corrente, o banco criador do dinheiro, nunca perde. E quem fala em família, pode falar em empresas ou países. Com isto também podemos responder à questão: o que é dinheiro? Dinheiro é dívida.
Quatro mil anos depois, continuamos com este mesmo esquema montado, e para muitos já nem se questionam por terem nascido nesta forma de vida. O problema é que este ciclo de crescimento infinito tem um tecto máximo a partir do qual deixa de poder ser especulado mais crescimento, e o jogo termina.  De acordo com as leis da física, ao qual todas as outras regras estão sujeitas, um paradigma de crescimento infinito num planeta de recursos limitados nunca irá funcionar.
As alternativas que permitem guardar a energia comunitária através de meios intermédios podem ser desde moeda local, feito pela própria comunidade, ou outros tipos de economias que não envolvam dinheiro. Essa discussão fica para outros artigos.
Adaptado da história inicial contada por Jem Bendell em The Money Myth (TEDx).

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