“Propor o crescimento econômico de forma exponencial, só pode ser coisa de um idiota, ou de um economista”. (Kenneth Boulding).
Introdução:
A relação entre a ciência econômica e a ecologia tem sido cada vez mais intensa por conta, basicamente, da prerrogativa do crescimento econômico. Essa relação é algo que intimamente não se desvincula facilmente e, em especial, essa necessidade de crescimento econômico, apregoada por alguns, é um dos pontos mais controversos dessa relação entre esses dois modos de pensar.
No entanto, essa relação, ao longo do tempo, não tem sido nada amistosa, separando, em lados opostos e conflituosos, duas maneiras antagônicas de atuar, no que toca, especialmente, à problemática do crescimento da economia versus exploração de recursos naturais. Visto por outro prisma, estamos nos referindo ao conflito entre as Leis da Economia versus as Leis na Natureza.
De um lado, há aqueles que defendem um crescimento a qualquer custo, vendo nisso a saída eficaz e rápida para os graves problemas sócio-econômicos que grande parcela das sociedades de hoje atravessam. De outro lado, há os que clamam pela interrupção imediata (propondo até crescimento zero) do crescimento que tem feito mais estragos, gerando passivos ambientais, que proporcionando benesses, propriamente dita.
O fato – inegável – é que a atividade econômica tem sido extremamente agressiva no que tange a extrair recursos, levar ao processo produtivo e, na hora do consumo final, ainda “soltar” seus resíduos, comprometendo, grosso modo, a capacidade do planeta Terra em lidar com essa situação.
Fora isso, aqueles que pensam que o consumo/produção precisa apresentar moderação, entendem que não há mais espaço físico – nem condições para isso – para taxas de “crescimentos exponenciais” visto que os recursos para tal são, por definição, finitos.
A biosfera é finita, limitada e hermeticamente fechada, diz com razão os que defendem a interrupção desse crescimento econômico sem limites, gerador e potencializador de passivos ambientais.
Conquanto, esse debate, além de interessante, é polêmico, visto tratar-se de abordagens muito conflitantes. Até mesmo porque existe o outro lado da história: há aqueles que entendem que a economia vive se “atualizando” e, certamente, dentro dessa atualização constante, encontrar-se-á, num belo dia, mecanismos para tratar os recursos naturais sobre a ótica da eterna renovação. Nem tudo, dizem aqueles que estão do outro lado desse assunto, é finito e está com os dias contados.
Para aguçarmos ainda mais esse debate, apresentamos neste artigo, em forma de apontamentos, algumas considerações sobre essa questão. Usaremos aqui, todavia, um termo já corrente sobre assunto, definido pela primeira vez por Lester Brown: Ecoeconomia.
Antes, cabe acrescentar uma indagação. Em que consiste tal termo? Trata-se, no bojo, da maneira específica de ver o sistema econômico e toda sua relação pertinente com o meio ambiente. É o ECO (de ecologia) em sua amplitude com o sistema econômico, tratando, especificamente, da maneira de lidar com os recursos naturais; com as energias naturais; com a finitude desses indispensáveis “combustíveis” que tanto faz uma economia crescer.
Vamos aos apontamentos visando englobar esse assunto numa temática mais ampla.
Apontamentos pertinentes
* Pelo menos desde o Neolítico (12.000 anos a.C.) todas as sociedades históricas consomem de forma crescente energias da natureza;
* É necessário conciliar a Economia com o Meio Ambiente, tendo em vista que tudo, absolutamente tudo, vem da natureza. Não é mais possível que os economistas (em especial os acadêmicos) continuem a ignorar essa realidade. A Economia precisa estar em fina sintonia com a Ecologia. Corrobora para esse argumento, o fato de que um dos primeiros formuladores do termo Ecologia, Ernst Haeckel (1834-1919), chegou a chamar a ecologia, em certo momento, de “a economia da natureza”;
* O fato mais grave, no entanto, é que a teoria econômica tradicional propõe o crescimento econômico sem limites, de forma exponencial e ininterrupto, a qualquer custo, e esquece, nesse pormenor, que a biosfera é finita, limitada e não aumentará de tamanho. Nesse sentido, é absolutamente ignorado pela Economia o pressuposto básico que aponta para um crescimento econômico capaz de produzir passivo ambiental. Essa questão é simples: não há espaço para todos; muito menos há recursos disponíveis (renováveis) capaz de oferecer o “Éden”, como querem alguns;
* Gandhi, um dos “Iluminados” que habitou o planeta Terra, a esse respeito, profetizava: “A Terra é suficiente para todos, mas não para os consumistas”;
* Conquanto, de forma estúpida, irracional e pouco inteligente – para dizer o mínimo -, a Economia não é mais entendida como gestão racional da escassez, mas sim como a ciência capaz de crescer exponencialmente, sendo que esse crescimento irá, na opinião dos “agentes econômicos agressores do meio ambiente”, curar todas as enfermidades do mundo;
Dessa forma, o quê temos pela frente?
* De um lado, temos então o “crescimento” das necessidades das pessoas; do outro, a cada ano, vemos que mais e mais habitantes que vão ocupando os mesmos espaços do planeta Terra (lembremos: a Terra não aumentará de tamanho). Descontadas as mortes, temos a cada dia, 200 mil novas almas no mundo. Ao ano, são mais de 70 milhões de novos habitantes no planeta Terra;
* No entanto, dizem os inconseqüentes (em especial os economistas acadêmicos pouco sensíveis aos problemas ambientais) que o mais importante é crescer, aumentando a produção para, assim, atender toda essa gente que está chegando ao planeta Terra.
(Para efeito de ilustração, cabe apontar que em apenas 50 anos, de 1950 a 2000, o PIB mundial saltou de 6 trilhões de dólares para 43 trilhões. Portanto, aumentou sete vezes de tamanho. E a população? Em 1900, havia 1,5 bilhão de pessoas no mundo. Hoje, dividimos o mesmo espaço no planeta Terra com 6,7 bilhões de pessoas);
* É necessário, definitivamente, pôr fim à idéia do crescimento econômico infinito e exponencial, por dois singelos motivos: 1° Esse crescimento não eliminará todos os males do mundo; 2° Os limites para tal crescimento são dados pelos recursos finitos da natureza;
* Diante dessa realidade inelutável, é possível concluir que a Ciência Econômica, desde seu nascedouro, se encontra anos-luz (*) de distância e totalmente “desconectada” da realidade ambiental, e, além disso, a ciência econômica não percebe os riscos que a insistência num crescimento (quantidade ilimitada) sem respeito à biosfera está provocando;
(*) 1 ano-luz equivale a 10.000 bilhões de quilômetros.
* A Economia que aí está, praticada de forma livre, leve e solta pelas sociedades modernas e industrializadas, ainda não se deu conta que se trata apenas de um subsistema da natureza e que depende dessa natureza para tudo – absolutamente para tudo;
* Vejamos que até mesmo as estrelas são essenciais nessa história da relação entre Economia e Meio Ambiente, pois são as estrelas que convertem o hidrogênio em hélio e, da combinação deles, provém o oxigênio, o carbono, o fósforo e o potássio, sem os quais não haveria os aminoácidos nem as proteínas, elementos indispensáveis à vida;
* No entanto, os “limites” ao crescimento econômico continuam ignorados (em especial pelos acadêmicos não comprometidos com a relação ambiental). Para o crescimento de qualquer economia é necessário matéria e energia. Acontece que o animal-homem não pode criar nem matéria nem energia. A fórmula do professor Einstein, a esse respeito, é precisa: a obtenção de mais energia somente é possível pela obtenção de mais massa. É necessário, portanto, mais matéria e energia para produzir mais matéria e energia;
* É assim que se movimenta, grosso modo, toda e qualquer economia – com massa e energia. Todo o maquinário (bens de capital) são produzidos com minérios e movimentado com combustíveis fósseis;
* Entretanto, infelizmente, o sistema econômico sempre viu a natureza e seus recursos como um mero objeto para ser transformado, explorado e sugado. Nunca, em momento algum, esse sistema que “regula” as atividades da economia, que conduz, por sua vez, a busca por taxas de crescimento econômico imperfeitos, falhos e destruidores, olhou para a natureza como algo a ser cuidado e protegido. A lógica que prevalece é a de sempre: a exploração;
* Diante disso, é possível afirmar que enquanto as leis da Economia continuar ignorando, por completo, as leis da Natureza, o futuro (o nosso futuro) estará, a cada segundo que passa, mais e mais comprometido, expondo, por conseqüência, todos nós em sério risco;
* Lembremos, outra vez: não é a Terra que entrará em extinção, com o desajuste entre a atividade produtiva e o sistema ambiental; somos nós. Quem então está condenado? A Terra? Não, nós – a nossa espécie;
* Urge entendermos, com isso, que é necessário trocar o crescimento (quantidade) por desenvolvimento (qualidade);
* Somente quando o colapso ambiental se fizer evidente para todos, talvez lembraremos, no momento da catástrofe final, das sábias palavras do cacique Seattle:
“Quando a última árvore for abatida, quando o último rio for envenenado, quando o último peixe for capturado, somente então nos daremos conta de que não se pode comer dinheiro”.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor universitário. Articulista do “Portal EcoDebate” e do site “O Economista”. Mestre pela USP em Integração da América Latina, especialista em Política Internacional, com curso pela Universidade de La Habana (Cuba). Autor dos livros “Conversando sobre Economia” e “Pensando como um Economista”.
Contato: prof.marcuseduardo{at}bol.com.br
EcoDebate, 02/07/2010
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