quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A dor da excessiva ternura - Gibran Kalil Gibran

Quando o amor lhes fizer um sinal, sigam-no

Por árduos e íngremes que sejam seus caminhos.

E quando suas asas o abraçarem, não reajam,

Mesmo que a espada oculta entre as penas os possa ferir.

E quando o amor lhes falar, creiam nele,

Embora sua voz possa despedaçar-lhes os sonhos

Como o vento do norte devasta o jardim.

Pois da mesma forma que o amor os coroa,

Também vai crucificá-los. Da mesma forma como favorece

Seu crescimento, também é responsável pela poda.

Da mesma forma que sobe aos galhos mais altos

E acaricia os ramos mais tenros que balançam ao sol,

Também desce às raízes e solapa seu apego à terra.

Como feixes de trigo ele os recolhe em si mesmo,

Debulha-os para deixá-los nus,

Peneira-os para livrá-los das cascas imprestáveis,

Mói-os até a brancura,

Amassa até que fiquem maleáveis,

E então os atira ao fogo sagrado, para que possam

Se tornar pão consagrado ao banquete santíssimo de Deus.

Todas estas coisas deverá fazer o amor com vocês,

Para que possam conhecer os segredos de seu próprio coração e,

À luz deste conhecimento, tornarem-se hóstias do pão da vida.

Mas se, por temor, só buscarem a paz e o prazer do amor

Então seria melhor que cobrissem sua nudez e abandonassem

A eira do amor, em busca do mundo insosso onde irão,

Mas não todo o riso, e chorarão, sem entretanto esgotar as lágrimas.

O amor nada dá senão a si próprio, e nada toma senão de si mesmo.

O amor nada possui, nem se deixa possuir,

Pois o amor se basta a si mesmo.

Quando amarem, não devem então dizer "Deus está no meu coração"

Mas sim "Eu estou no coração de Deus".

E não pensem que podem dirigir os passos do amor,

Pois ele, se os julga dignos, é que vai guiar seus passos.

O amor não tem outro desejo senão realizar-se a si mesmo.

Mas se vocês amarem, e por isso tiverem desejos,

Então que seus desejos sejam estes:

Derreter-se e ser como um córrego murmurante

Que dedica à noite sua melodia,

Conhecer a dor da excessiva ternura,

Ferir-se pela própria compreensão do amor

E deixar-se sangrar de bom grado e com alegria,

Acordar à alvorada com um coração sublimado

E entoar aleluias por outro dia de amor,

Descansar ao meio-dia e meditar sobre o êxtase do amor,

Voltar a casa com gratidão

E então adormecer com uma prece pelo bem amado no íntimo

E um cântico de louvor nos lábios.


Gibran Khalil Gibran

Um comentário:

  1. Primeiro que adoro esse autor, tenho um irmão chamado Gibran em sua homenagem... Mas para, além disso, reli essa semana "O Profeta" e vale a dica para quem quer se questionar, mais um pouco, sobre o que são as coisas que envolvem nosso cotidiano... trabalho, amor, dor, habitação... Bjs

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