sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Crise: As moedas Complementares - Rose Marie Muraro

Crise: as moedas complementares
(Rose Marie Muraro)
Depois da primeira guerra mundial, nos anos 20, a Alemanha passou por uma hiper
super mega inflação, a maior que o mundo já viu. As firmas faliam e o povo estava
morrendo de fome e de frio. Um homem, dono de uma mina de carvão que estava à beira da
falência não podia mais pagar seus empregados. Combinou então com eles que se
quisessem receber seus salários, cada um receberia um carnê com 15 selos no valor do
salário e lastreado na produção de carvão da sua mina. Sem saída, eles aceitaram. O patrão
combinou então com algumas mercearias e farmácias que poderiam receber a nova moeda a
que chamou de “wara” e os operários teriam que viver com esta moeda. Uma vez gastos os
15 selos, poderiam vir e receber seu salário e os pequenos comerciantes e pessoas que
aceitavam a nova moeda poderiam receber carvão em troca dos selos. Ele assim multiplicou
por 15 o valor de cada salário a aumentou a sua produção. A moeda deu tão certo que os
operários não só conseguiam comer, vestir- se e curar suas doenças, como começaram a
melhorar a cidade, construir pontes e etc.
A fama da nova moeda logo se espalhou e ela foi introduzida em cerca de duzentas
cidades como moeda complementar para aqueles que não conseguiam receber marcos.
Quando o Banco Central Alemão soube, tornou a moeda ilegal e a primeira mina de carvão
faliu. Nas cidades as pessoas voltaram à miséria. E em 1933 Hitler subia ao poder com a
promessa de uma Nova Grande Alemanha.
Pouco depois, em meados dos anos 30, o prefeito de uma pequena cidade da
Áustria, que possuía apenas 40 mil “schillings” para projetos, o que não era nada, idealizou
uma moeda semelhante ao “wara”, a que chamou de “worgl” lastreado nos 40.000
schilings. E assim, a nova moeda aumentou muitas vezes o valor de cada schiling e o povo
mais uma vez sau da miséria. E mais uma vez o Banco Central Austríaco colocou a moeda
na ilegalidade. A miséria voltou às cidades que vieram a adotar o worgl. Em 1937 Hitler
anexava a Áustria à Alemanha.
Enquanto isso, nos EUA, depois da Grande Depressão de 1929 o país chegou aos
mais baixos níveis econômicos de sua história. Lá, as populações adotaram moeda
complementar do mesmo tipo do wara e do worgl a que chamaram de “stamp scrips” que
também foi magnificamente bem sucedida. Até que o maior economista americano da
época e professor de Harward, Irving Fisher procurou Dean Acheson dizendo - lhe: “Esta
moeda pode tirar o país da Grande Depressão em três semanas”. Roosevlt, então recém
eleito se apavorou e também colocou o stamp scrip na ilegalidade. Fez o “New Deal”, deu
dinheiro ao povo americano, o que já foi alguma coisa, mas não o suficiente para salva- lo
da miséria. E os EUA se tornaram a maior potencia do mundo só a partir da Segunda
Guerra Mundial.
Estes fatos estão no livro “The Future of Money” de Alfred Liêtaer, um dos
arquitetos do euro e considerado pelas revistas especializadas um dos maiores especialistas
em moeda do mundo. Diz o autor que depois da segunda guerra, começou o uso sistemático
desse tipo de moedas em muitos países desenvolvidos ou não. Hoje elas são no mundo
cerca de 10. 000, principalmente nos países mais pobres, ajudando a tirar suas populações
da fome. No Brasil temos 90 municípios que usam moedas complementares.
O primeiro foi a Favela Palmeiras com 30.000 habitantes na grande Fortaleza que
introduziu o “Palma” moeda complementar no fim dos anos 1990 lastreado por uma doação
do Banco Popular do Brasil e foi administrada pela própria comunidade. No início da
primeira década de 2000, houve um monitoramento por parte do Banco Central, que, ao
invés de colocar a moeda na ilegalidade, incentivou o seu uso, inclusive considerando que
ela devia ser implementada nas áreas mais pobres de todos os municípios brasileiros. Hoje
já há 90 municípios em nosso país que adotam moedas complementares. A Favela de
Palmeiras virou um bairro popular pela ação dos próprios favelados, o que se repete em
outros municípios.
O mundo está vivendo sua maior crise depois de 1929. Seria o momento ideal de
implementar internacionalmente este tipo de moeda que nada mais é do que uma mediação
do escambo e portanto não tem custo para os países. Quanto a nós brasileiros, seria o ideal
implementar estas moedas, integrando-as à Bolsa Família, que o tiraria do assistencialismo
colocando-o como um dos projetos pioneiros no mundo de inclusão social e econômica.

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