sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Redes Comunitárias - Luis Fernando Sarmento

Luiz Fernando Sarmento
Aqui, dando continuidade ao texto Visão de Mundo,
tento sistematizar o que vislumbro como Redes Comunitárias.
Como tudo, ou quase, um risco.
Redes Humanitárias Comunitárias
Interesses comuns fazem com que um se comunique com outro que
se comunica com outro que se comunica com todos que se
comunicam com cada um e todos. Cada um agora tem acesso a
outro e a todos.
É a rede. É instrumento, é meio, é base para relacionamentos.
Facilita comunicações, acessos a informações. Pressupõe
autonomia, não hierarquia. A iniciativa é individual. O
compartilhamento é coletivo. A interação é decorrência.
Seus conteúdos indicam seus efeitos.
Como na natureza, a semente indica a árvore, o fruto.
Redes de Redes
Quando um que faz parte de uma rede se comunica com outro que
faz parte de outra rede, dá partida para um sistema de redes. Rede
+ rede não é soma, é multiplicação de possibilidades de
intercomunicações.
Síntese
O conteúdo da rede é sua essência.
A essência da rede é seu conteúdo.
Objetivos
As Redes Comunitárias são aqui instrumentos para o
desenvolvimento sustentável integral - emocional, físico, econômico
- de cada um e de todos, especialmente os hoje excluídos.
Para isto, aqui e atualmente, redes comunitárias procuram facilitar
conhecimentos mútuos, trocas de informações, parcerias e soluções.
Espaços
Como outras redes, as Comunitárias são dinâmicas: agora
diferentes de antes e depois. Variam virtual e fisicamente. Alguns
encontros presenciais facilitam a sua formação.
Hoje, há espaços para reflexões não conclusivas: os Livre Pensar
Social, os Movimentos Emocionais e Transformações Sociais. Há
espaços propícios a parcerias e realizações: os Encontros
Comunitários. Em todos, estímulos à criação e fortalecimento de
vínculos.
Chega Mais
Suavidade. Singeleza. O diferencial está no acolhimento. E,
naturalmente, quem cuida de si mesmo poderá ter melhores
condições de cuidar de outros. Só dá quem tem. Só dá de si se tem
em si.
Acolher aqui significa facilitar, em cada ato, em cada passo, a
inclusão, o compartilhamento de informações e ações. Criar
oportunidades para que cada um e todos se expressem, respeitados
os limites, especialmente dos focos e dos tempos. Ética como
princípio.
Desejos
Vejo o que nunca vi, desejo o novo. Necessidades - físicas, afetivas,
financeiras e mais - são volta e meia despertadas. Especialmente se
o desejante sente falta e não sabe de que, de quem. Tende então a
substituir o que deseja - mas não sabe - por objetos que por um
tempo poderão suprir o vazio.O que não sabe - mas provoca em si desejos substitutivos atuais -
pode, como exemplos, estar relacionado, lá atrás, com um parto
difícil, um desmame precoce, ausências de afeto, falta de comida e
recursos... Ou com sofrimentos de violências físicas, emocionais
mais recentes. Desejos substitutivos não excluem puros desejos.
Desejos não supridos ampliam vazios. Muitos dos desejos não
emergem, desaparecem quando o desejante está emocionalmente
suprido. Sócrates, parece, tinha razão: conhece-te a ti mesmo.
Mercado Social
Na feira – no teatro, restaurante, livraria, banco, hospital... - uns
oferecem, outros procuram. Ali se encontram e interagem, se
satisfazem. Neste momento agora, em algum lugar, alguém, alguéns
devem estar à procura de pessoas com características semelhantes
às nossas, à procura de afetos, objetos e serviços que dispomos.
Não sabem que existimos, não sabemos quem são.
Em comunidades, populações inteiras desejam se suprir de
necessidades básicas - comida, casa, condução, luz, esgoto,
trabalho, conhecimentos, insights, afetos > cultura...
Umas se suprem de um tudo ou de um tanto, trabalham, se
alimentam, divertem-se, se desenvolvem econômica e
emocionalmente. Outras, quase nada, falta um quase tudo. Querem
trabalho, não têm. Têm fome, também. Minguam. Sofrem violência,
implodem, explodem.
Uns não sabem dos outros. Ou sabem, mas não conhecem como
chegar perto, se relacionar, interagir. Alguns nem entre si se
conhecem.
Os que têm se sentem ameaçados, se protegem, se fecham,
atacam. Ou não: quando se encontram, juntos criam soluções,
compartilham. Comunidades, pessoas e instituições oferecem
recursos que dispõem – os mais diversos, financeiros ou não - a
outras que procuram.
Encontros
A Rede Comunitária se forma, se amplia nos encontros. Como
instrumento, o principal objetivo da rede é o desenvolvimento
integral do indivíduo e da coletividade. Em integral leia-se emocional,
econômico, cultural e mais.
Os modos como os encontros se dão, já, em si, adotam práticas de
inclusão, simplicidade, eficiência, eficácia, efetividade. A
metodologia é dinâmica, comporta criatividade e adaptações às
realidades locais.
Cada encontro contribui para o processo de organização e
emancipação social. Um cuida do pensar livremente o social, sem
intenções conclusivas. Abre janelas e ao mesmo tempo propicia
vínculos entre os representantes de instituições. Outro se foca no
desenvolvimento emocional como base para o desenvolvimento
humano, comunitário, social. Outros facilitam integrações e práticas
de parcerias.
As redes formadas em cada encontro se inter-relacionam. Ampliam-se
como redes de redes. E se multiplicam quando interligadas a
outras redes internas e externas às instituições que as promovem,
ao bairro-comunidade, ao Rio, à América Latina, ao mundo.
Incontroláveis, incomensuráveis. Parece brincadeira e não deixa de
ser.
Livre Pensar Social
Articuladores, apoiadores e realizadores de projetos comunitários -
sem compromisso conclusivo ou deliberativo - compartilham idéias,
informações e reflexões focadas em desenvolvimento humano e
social.
Sua dinâmica contempla breves falas de um ou dois convidados -
sobre temas de sua especialidade - cabendo aos demais um espaço
democrático de participação, diálogo, debate.
Para facilitar intercâmbios, o número de participantes é limitado e a
metodologia inclui equalização das instituições presentes, cadeiras
em roda e curtos tempos de falas focadas no compartilhamento de
informações entre os presentes.
Na prática, além das possibilidades de absorção de novos
conhecimentos e ampliações de visões, estes encontros fortalecem
vínculos entre representantes das instituições participantes –e
facilitam micro e macroparcerias.
METS
Movimento Emocional e Transformação Social: este encontro
procura congregar profissionais - que consideram desenvolvimento
emocional como base para desenvolvimento humano e social - e
representantes de instituições públicas, privadas e do 3º setor que
atuam direta ou indiretamente junto a populações excluídas e que se
interessam ou poderão se interessar por intervenções similares.
Também aqui, é limitado o número de participantes e a metodologia
é semelhante à do Livre Pensar Social. É um encontro não
conclusivo, interativo, reflexivo, onde todos e cada um têm tempo e
espaço para compartilhar idéias e informações.
Encontros Comunitários
São mini-fóruns mensais voltados para a facilitação e realização
prática de parcerias entre realizadores de projetos sociais,
representantes de comunidades, instituições privadas, públicas e do
terceiro setor.
Um a um, cada participante se apresenta e fala do que veio
procurar e do que veio oferecer. Todos têm oportunidade de falar.
E, quando cada um sabe quem é quem, o espaço se abre para o
aprofundamento de relações e formação de parcerias.
Assim as Redes Comunitárias têm se expandido.
Encontros Comunitários: Metodologia
Nestes encontros, cada um, no máximo de um minuto,
se apresenta e fala do que procura, do que oferece.
Depois de todos se apresentarem,
conversas individuais aprofundam re-conhecimentos,
na busca de concretização de parcerias.
Tem dado certo.
Todos têm a oferecer. Seja o espaço, seja a facilitação de acesso à
comunidade. Ou o contato com públicos locais ou os conhecimentos
e energia do lider informal. Ou ainda o trabalho voluntário,
eventualmente recursos, experiência, know-how, vagas -
remuneradas ou não - para estágios ou serviços...
Ao mesmo tempo, todos procuram parceiros.
No mini-fórum, um exercício da democratização de oportunidades,
de qualificação e equalização dos participantes.
Cada um, aqui, tem algo a oferecer ou procura por algo.
Nestes momentos, somos iguais.
E são muitos e os mais diversos os atores sociais que participam
das Redes. Lideranças e empreendedores comunitários,
representantes de instituições informais e formais - públicas,
privadas e do terceiro setor.
Metodologia, detalhes
Para facilitar intercomunicações e realizações, são disponibilizadas
Listas de Participantes (disponíveis, se solicitadas), com contatos-telefones
e/ou e-mails - de todos que participaram até o encontro
anterior.
E, complementando informações, os Classificados Sociais
(disponíveis, se solicitadas), onde instituições expõem o que
procuram, o que oferecem e relatam parcerias realizadas.
Começa na hora marcada. Com quem esteja presente, em respeito
aos que já chegaram. Na sala grande, cadeiras em roda. Na
medida em que novos chegam, os participantes iniciais cedem
espaços, se ajeitam para acolhê-los. A roda aumenta.
De início, informa-se a pauta. E o método: cada participante terá
um tempo - 1 minuto, 2 minutos - para falar seu nome-telefone-contato,
que grupo-instituição-comunidade representa, o que veio
oferecer, o que veio procurar. E, fechando esta fase de mútuas
apresentações, brincadeira interativa, jogo cooperativo.
Jogo Cooperativo, exemplo
Tipo: uma – imaginária ou real – bola de soprar para cada um.
Todos são convidados a se levantar, a caminhar dentro da roda,
sempre levando consigo sua bola-que-representa-seu-projeto
comunitário.
Sugere-se que cada um procure – por exemplo – alguém com
sapatos claros. Encontrou? Encoste seu pé no dele, dela.
Encostou, parou, pés colados.
Agora - permaneça colado - veja ao redor quem tem camisa-blusa
mais clara.
Coloque a mão esquerda no ombro desta pessoa.
Sempre cuidando de seu projeto, representado pela sua bola.
Ainda sem sair do lugar,
a mão direita no ombro de quem esteja com saia
ou calça comprida escura
ou - invente, experimente -
no ombro de quem assovie o mais bonito.
Neste caso, é sugerido antes
que cada um capriche um assovio.
Situação de empatia armada, o aviso.
Olhos fechados, quando contarmos até três,
no três é jogar a bola-projeto para cima.
E cada um e todos tentaremos mantê-los no alto.
Um... dois... três.
E, fala de fechamento:
as bolas que estourarem
são os projetos que dão certo.
Plum-plá-plact-zum... integração.
Metodologia, mais detalhes
Segunda fase:
Agora, ao lado, mesa com frutas-suco-refresco-biscoito-café-água.
Cada um troca idéias-informações com quem tenha interesse
comum.
Apresentações feitas, informações trocadas, encontros marcados,
parcerias articuladas, boca-a-boca a rede se amplia.
Animação de Rede
A primeira fase de um encontro comunitário é de apresentação de
cada um a todos. Uma segunda fase, ao redor da mesa com
alimentos, é a possibilidade de conversas individuais livres: cada um
procura aquele ou aqueles por quem se interessou e, aí, aprofunda a
troca de informações e recursos, articula parcerias.
Cada encontro comunitário
pressupõe a existência de um moderador.
Algumas ações são reais e simbólicas:
começar na hora significa respeitar os que já chegaram.
Formar uma roda do tamanho dos que chegaram significa
que todo novo chegante poderá ser acolhido como quem nos
visita em casa: puxa uma cadeira, se inclui.
Alimentos saudáveis no lanche significam cuidar da vida.
Distribuição de Listas de Participantes e Classificados
Sociais significa compartilhamento de informações básicas e
fortalecimento de possibilidades de intercomunicações e, em
decorrência, parcerias e realizações.
Distribuição de textos simples que geram reflexões -
eventualmente insights - ampliam visões de mundo,
possibilitam transformações de comportamentos.
Enviar convites - virtuais e físicos - com antecedência de 30
dias significa: agende-se. De novo, com antecedência de 7
dias, um reforço: desejamos mesmo sua presença.
Telefonar na semana anterior ao encontro para aqueles que
não dispõem de e-mails significa incluir os que não têm e-mails.
Algumas regras devem ser esclarecidas de início:
cada participante, logo na entrada, deve preencher uma
identificação – nome pessoal, instituição que representa.
Durante o encontro, deve expor no corpo este adesivo ou
crachá. Facilita encontros.
Logo no início, a cada um é entregue
lista atualizada com informações
- instituição, contato, telefone e e-mail -
relativa a todos que têm participado dos encontros
realizados anteriormente. E datas-horários-locais previstos
para encontros comunitários dos meses subsequentes.
Também atualizados e distribuidos os
Classificados Sociais,
impressos que reproduzem informações relativas
ao que é oferecido e procurado por cada instituição,
além de parcerias já realizadas ou em andamento.
Outras informações poderão ser oferecidas por cada
participante: cartões, folhetos, revistas, informativos.
Na primeira fase cada um terá um tempo - 1, 2, 3, mais
minutos? - para se expressar. Neste momento deverá manter
o foco do encontro - informar nome, instituição que
representa e, objetivamente, o que veio procurar, o que
veio oferecer.
Eventualmente uma ampulheta, manobrada pelo próprio
falador da vez, lembra a ele ou ela do limite de tempo. Ou
esta lembrança é estimulada por uma bola grande, colorida,
que passa de mão em mão e permanece com quem fala
durante sua fala. Pronto. Bola para frente.
O mediador tem aqui a função de, afetiva e efetivamente,
orientar, cuidar do timing.
Aqui cabem todos, independente de título, sexo, raça, cor,
tamanho, crenças, credos. Assim não cabem aqui falas
político-religiosas partidárias.
Solicita-se: só ofereça o que tem condições de oferecer e cumprir.
Só procure o que necessita.
Se muitos os participantes do encontro, somente um fala por cada
instituição. Se excessivo o número de participantes, bom problema.
Merece criatividade em soluções.
Cada um - se deseja divulgar suas informações - deve preencher
um formulário com nome, instituição, telefone, e-mail, endereço. E
mais o que procura, o que oferece, as parcerias já realizadas ou em
andamento.
Estes dados comporão uma Lista de Participantes e os
Classificados Sociais - que serão multiplicados e distribuídos,
em papel ou por e-mails, para todos os participantes do
próximo encontro e para quem mais o desejar. O objetivo é
facilitar intercomunicações e parceria.
Futuro, logologo
Os objetivos - desenvolvimento integral individual e coletivo >
aliados à metodologia simples, afetiva, eficiente, inclusiva,
interativa - estimulam iniciativas de expansão das Redes
Comunitárias.
Somos muitos - pessoas, instituições informais e formais - tanto os
que desejam se suprir quanto os que desejam contribuir com
suprimentos.
Na medida em que nos encontremos, tomemos conhecimento dos
desejos mútuos, nos conheçamos e criemos relações de confiança,
aumentam as possibilidades de realizarmos complementações e
parcerias.
Instituições financeiras fortes, braços operacionais públicos e
empresas privadas com visão social têm tido dificuldade em
identificar e acessar instituições formais ou informais
potencialmente usufruidoras do que oferecem.
Metodologias tradicionais - uns poucos falam, muitos escutam
- podem não cumprir satisfatoriamente suas intenções de
integrar participantes, gerar intercomunicações, interações,
realizações. Naturalmente instituições vivas tenderão a adotar
metodologias que supram seus objetivos.
Por outro lado, encontros em rede com metodologias e objetivos
similares à aqui descrita têm se expandido no Grande Rio.
Acreditamos que, em sua busca de inclusão e expansão de ações
parceiras, comunidades de todo o Brasil e da América Latina - e de
quaisquer nações com recursos sub-aproveitados - tenderão
naturalmente a também adotar soluções tão simples como os
compartilhamentos individuais e coletivos de excessos. Também o
que é bom se espalha.
Continua no próximo capítulo
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